sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Ivy League no Restaurante O Senhor Abade


Jogador
Selecionador
Classificação
Sauternes 2009
António Octávio
Paul Blanck Furstentum Riesling 1999
Isabel Braga
Paul Blanck Altenbourg Vendages Tardives Pinot Gris 1998
Hildérico Coutinho
Luís Pato Vinhas Velhas Branco 1995
Luís Castanheira
Quinta dos Roques Encruzado 2001
Alexandra Amorim
Montes Alpha Syrah 2002
Francisco Rodrigues
Quinta da Carolina Tinto 2006
Ana Rodrigues
Quinta do Crasto Vinhas Velhas 2009
Maria Manuel
Taylor's Tawny 30 Anos
Susana Teixeira


Esta terá sido certamente a primeira jornada em que acabámos por ter mais treinadores que jogadores, isto porque um dos jogadores selecionados estava afinal com uma gripe tal que nos embotava o nariz e que o povo conhece por TCA. E que pena foi, pois este jogador vinha da Áustria e tinha sido colhido tardiamente… Devia ser um latagão!
A jornada teve também um número anormal de participantes, mas eu não podia deixar de conhecer um amigo de um grande amigo que por sinal está em Luanda e creio que ninguém se terá arrependido destes dois participantes extra, pois não só o vinho não faltou graças ao comedimento das senhoras, que desta vez estavam em paridade (quotas para quê?) e porque, ainda assim, tivemos a oportunidade de degustar 9 vinhos num mui agradável serão com boa comida e disposição.
Antes de falar da prestação dos jogadores queria realçar os três pratos que me pareceram ser os mais aplaudidos:
- Filetes de cavala em “banho de imersão” de azeite! Na minha opinião pecavam pelo excesso de gordura do peixe e do azeite. Eu teria colocado aqui algum elemento que tornasse menos pesado este prato, como um tomate confitado ou uma “cebolada” de pimentos com um bom vinagre que acidificasse a coisa.
- Lampreia em conserva feita pelo João Bahut, cozinheiro e estudioso de receituário antigo, a acarinhar e aplaudir e isso só se faz indo lá!
-  Congro ensopado como se faz em Bragança. O melhor da noite com um molho fricassé absolutamente divinal em elegância e sabor. A repetir!
Utilizarei a ordem de serviço e começarei pelo Sauternes, que sendo uma novidade para alguns acabou beneficiado por isso. Este é um vinho que eu não consigo perceber por quem é feito. Penso que poderá ser feito por uma cooperativa, mas não sei e gostaria que alguém me ajudasse. Eu já tinha bebido outras colheitas deste vinho e esta foi a única que me impressionou e que me leva a crer que este ano poderá ser outro ano de excelência. Fui investigar e de fato, é isso que dizem os críticos, apontando este como o sucessor direto da fantástica colheita de 2001. Aconselho-vos pois a experimentarem um Sauternes ou um Barsac, região limítrofe de características semelhantes, de 2009 de alguns dos grandes produtores normalmente reconhecidos através da classificação premier cru.
O segundo vinho foi uma surpresa ainda maior para alguns dos participantes, não tanto por não conhecerem a casta Riesling, mas mais por nunca a terem bebido com uns anos valentes em cima.  E que bem que lhe fica a idade, fazendo com que este vinho que é seco e com notas petroladas pareça adocicado graças às notas de frutos secos, frutos de caroço desidratados e mel. Uma delícia e esta foi das melhores que bebi desta colheita, que este vinho já está naquela idade em que a qualidade depende imenso da garrafa que se abre. Sorte a nossa.
Se há alguma região que origina Pinot Gris voluptuosos, densos, geniais, essa é sem sombra de dúvida a Alsácia. Se a isso somarmos umas uvas colhidas mais tarde e um dos produtores mais aclamados da região facilmente percebemos que o resultado só poderia ser este, um vinho profundo, com doçura qb e que, diga-se em abono da verdade, muito o beneficiou na votação, elegante, pouco ácido mas o suficiente para não o deixar ser enjoativo. Foi considerado o melhor da noite por 3, enquanto o anterior o tinha sido por 4, mas votações médias mais altas levam-no ao lugar mais elevado do pódio.
O Luís trouxe um vinho que tinha estranhado na primeira vez que o bebeu, mas tal como a coca-cola, entranhou-se. Pelo resultado conseguido, que muito me surpreendeu, já não estranha tanto assim. Um vinho bairrada típico, com toda aquela mineralidade e sabor de barro típico da região bem controlado pelos aromas típicos de um vinho velho. 17 anos não é nada para alguns brancos desta região, mas este está no limite. A beber enquanto dá imenso prazer.
Depois veio outro branco velho, desta vez do Dão, de uma das minhas castas preferidas, o Encruzado, mas ele foi prejudicado por ter sido servido depois do bairradino, que de tão potente fez este parecer água, boa sem dúvida, mas água!
Vieram depois os tintos, com um Syrah, de um produtor que adoro, mas neste caso abalado pelos 10 anitos de vida. Está magro e apenas ficaram as notas apimentadas da casta, que sem a doçura da fruta o torna difícil para a maioria.
O Quinta da Carolina foi para mim o menos interessante e a verdade é que não ficou na memória de ninguém.
E só em 5º lugar na classificação os tintos aparecem, com o Crasto Vinhas Velhas 2009 na frente deste pelotão, graças sem dúvida às notas de frutos negros doces e algumas notas florais, certamente da Touriga, taninos suaves e bom corpo. Agradou mas apenas encantou um dos convivas que o considerou o melhor da noite.
Em 6º lugar na classificação geral e uma verdadeira surpresa para mim, ficou o tawny da Taylor’s que usualmente mais me agrada, o 30 anos. Para mim e mesmo não lhe reconhecendo o valor de outrora, foi o melhor da noite.

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Ivy League no Clube da Gula


Esta estada em Portugal, mais longa do que o esperado, tem pelo menos a virtude de poder realizar, a pedido de alguns “ferrinhos”, mais umas sessões das já saudosas Ivy Leagues.
Na falta do local habitual, começamos aquele que será uma ronda pelas capelinhas e começámos pelo Clube da Gula num gesto de reconhecimento por tudo o que a Helena tem feito em prol da divulgação da enofilia.
Esta jornada trouxe muitos e bons vinhos como poderão confirmar, alguns com muito para contar…
Vinhos pela ordem de serviço                                 Jogador                                Classificação
Informal 2010                                                           Sérgio Santos                         10º lugar
Blandy's Terrantez 20 Anos                                       Orlando Costa                         3º
Toques et Clochers Limoux Chardonnay 2007           Sérgio Santos                          6º
Louis Latour Corton-Charlemagne 2008                    Alexandre Braga                      7º
Charme 2009                                                            João Crispim                            4º
Vinhas da Ira 2005                                                    Hildérico Coutinho                   5º
Barca Velha 2004                                                     Isabel Braga                              2º
Lagoalva de Cima Syrah 2005                                  Alexandra Amorim                     1º
Luís Pato Abafado Molecular Branco 2010               Hildérico Coutinho                     9º
Málaga Moscatel                                                      Luís Império                               8º

Esta jornada teve a particularidade de poder ajudar a responder a uma pergunta que sistematicamente me fazem: qual é o melhor vinho português? sendo que quase todos eles já têm a resposta pronta, o Barca Velha, não é?
Pois desta vez havia o aliciante de termos em prova o último Barca Velha que saiu para o mercado, o 2004. Ainda não o tinha provado e resolvi testá-lo, colocando em prova vinhos com praticamente a mesma idade, 2005, um alentejano, o Vinhas da Ira, o outro do Tejo, antigamente Ribatejo, o Lagoalva de Cima - Syrah, que custam uma quinta parte do ícone português e provêm de regiões que, dizem os entendidos, tem menor potencial de envelhecimento.
Eu costumo dizer a quem responde à questão colocada com a resposta habitual com um desafio. Eu coloco nove vinhos até aos vinte e tal euros e em prova cega eu aposto que o Barca Velha fica a meio da tabela.
Desta vez e apenas com mais um vinho tinto em prova, o Charme 2009, também do Douro, mas com um perfil completamente diferente, não ganharia a aposta se fossemos rigorosos, mas não ficaria longe da vitória.
A boa nova é que este 2004 é, para mim, claramente melhor que o seu antecessor, o 2000, não apresentando este notas que me deixam desatinado, o suor de cavalo que se quisermos ser simpáticos chamamos couro. Não consegue todavia, como previra, destacar-se dos demais, sendo mesmo ultrapassado por um concorrente. O mais curioso é que quase todos o identificaram, tendo todos trocado o Vinhas da Ira pelo Lagoalva de Cima. Eu explico o porque de me ter enganado, não por não ser habitual, mas neste caso o Vinhas da Ira apresentava umas notas que eu identifiquei como pimenta preta, que é nada mais nada menos que a marca distintiva habitual da casta……………………………………..ahh?
Syrah, pois então. Além disso apresentava um perfil mais para o elegante, com pouco volume de boca, como tenho encontrado em outros Syrah’s. Enfim, por vezes também queremos enganar-nos a nós próprios. Teria sido o caso? A verdade é que se tratava do Vinhas da Ira, tendo aquele que pensávamos tratar-se deste tratar-se afinal daquele que todos colocariam em último lugar, o Lagoalva de Cima que ganhou a prova com quatro dos participantes a considera-lo o vinho da noite e sendo que o Barca Velha não foi o vinho da noite para ninguém!
Espero com isto ter respondido à questão, ou seja, essa é uma questão que se não deve colocar, simplesmente porque não tem resposta.
Falemos agora dos brancos em prova, que mesmo não ganhando a prova, não só eram muito bons como têm ambos muita história para contar.
Comecemos pelo que foi servido em primeiro, oriundo de uma região pouco considerada, Languedoc/Roussillon, situada no sul de França, nas fraldas dos Pirenéus, mas que ganhou ao vinho proveniente de uma das mais famosas vinhas do mundo na Borgonha, ambos utilizando única e exclusivamente a casta Chardonnay.
Creio que é a segunda vez que provo um vinho de Limoux, mas só agora me apercebi um pouco da história que está por trás dos vinhos desta zona. Que falha e com que vontade de conhecer fiquei depois de saber que este vinho em particular foi leiloado num festival anual de música, artes, gastronomia e vinho. Que mais poderemos querer? Está bem, ok, eu sei, mas podem sempre levar convosco. Anualmente a festa é liderada por um Chef convidado (“Toques”) e o resultado do leilão é utilizado para recuperar uma das quarenta torres sineiras (“Clocher”) desta região, permitindo assim manter a traça arquitetónica desta região. Temos tanto para aprender…
Vejam através deste vídeo e outros que por lá há e o porquê de ter ficado com formigueiro no rabo…  http://www.youtube.com/watch?v=lHsYZGBtKtQ
E porque é que este vinho ganhou ao borgonhês? Porque está pronto para beber e, não sendo muito complexo, tem uma mineralidade e uma estrutura muito agradável e é certamente diferente dos habituais chardonnays, não tão fácil e óbvio, mas disso já estamos um pouco fartos.
O outro branco, proveniente de uma das mais famosas vinhas do mundo, que pouco mais é que um cabeço com aspeto de cogumelo pelo topo estar cheio de árvores e em que as vinhas mais altas são da casta Chardonnay e as mais baixas de Pinot Noir.
Estas vinhas pertenceram ao imperador Carlos Magno e até ao século oitavo produziam apenas vinhos tintos, mas a certa altura, a mulher do imperador, cansada de ver as barbas do marido pintadas de vermelho resolveu impor a sua vontade e as vinhas foram replantadas para produzir vinho branco, algo que se mantém até hoje. Ainda havia dúvidas acerca de quem manda?
Esta pequena sub-região da Côte de Beaune tem 1 AOC para tintos denominada Corton e 3 para brancos, Charlemagne é uma vinha tão pequena que na prática quase todos os produtores juntam as uvas provenientes desta vinha com as vinhas vizinhas e lançam o vinho sob a denominação Corton-Charlemagne, mas existe ainda uma outra, porventura ainda mais rara e que tem o mesmo nome da AOC para tintos, simplesmente Corton.
E porque passo a vida a ouvir dizer que nós não temos produção para os grandes mercados, não posso deixar de referir, que em conjunto, todos os produtores da AOC Corton-Charlemagne conseguem lançar no mercado anualmente cerca de 300 mil garrafas de vinho. E estavam a falar de quê?
E porque é que este vinho perdeu para o outro branco apesar de todos reconhecerem um maior potencial neste vinho? Porque mais uma vez cometemos um infanticídio. Está demasiado novo e não apresenta grande complexidade por isso mesmo. Tem no entanto uma mineralidade, acidez e profundidade notáveis, que no futuro serão de grande valia quando o vinho ganhar os aromas terciários de que necessita.
E como esta crónica já vai longa e dos vinhos de sobremesa pouco há a dizer, vou apenas referenciar o Blandy’s e falar-vos da delícia que é a utilização destes vinhos secos da Madeira para acompanhar entradas. Naõ deixem de o fazer quando puderem, se não for com a casta Terrantez, mais rara, façam-no com a Sercial. Fiquei surpreso com a doçura deste vinho que esperava mais seco. Era pelo menos essa a memoria que eu tinha destes vinhos que poucas vezes bebi. Esperemos que não passem muitos anos antes de voltar a beber um Terrantez que felizmente salvaram da extinção. Um bem haja aos madeirenses.