Era prevista a presença da Ivone Ribeiro nesta jornada, que
se justificava plenamente não só por todas as provas que já nos possibilitou,
tanto na Vinho e Coisas como na Wine O’Clock, mas também por estar de saída e a
abraçar um novo projeto, desta vez numa grande distribuidora nacional que me
parece estar a tentar abordar o mercado de uma forma diferente. Assim espero
pois se há algo que continua mal na restauração em Portugal é o serviço de
vinhos. Aliás, esta situação é algo que mexe com o meu sistema nervoso sempre
que penso no que é que as revistas da especialidade e os críticos de vinhos e
de gastronomia têm feito para que essa situação se altere: QUASE NADA.
Alguns, os de vinhos, poderão dizer que não é da
responsabilidade deles fazer o que quer que seja para alterar esse panorama. A
mim parece-me profundamente errado que alguém que goste de vinho, como é
suposto estes senhores gostarem, não o queira ver ser bem servido à temperatura
correta e em copos adequados a cada estilo, atraindo assim mais pessoas para
este mundo de que pensam não gostar por ser a maior parte das vezes mal servido
e quanto mais não seja para poderem usufruir quando forem ao restaurante …
Outros, os de gastronomia, dizem que não é para isso que lá
estão e eu não consigo entender isso, pois a avaliação de um restaurante tem de
ser feita no seu todo e não apenas em algumas partes, eventualmente onde nos
sintamos mais confortáveis, mas convém não esquecer que também em Portugal
existem cada vez mais pessoas que se sentem defraudados se os restaurantes não
tiverem copos adequados e cartas de vinhos minimamente elaboradas e já nem falo
das temperaturas dos vinhos porque essa questão é por norma ultrapassável desde
que se tenha algum tempinho.
Por último, os das revistas da especialidade, vão-me dizer
que não é verdade, pois até têm promovido o vinho a copo e até avaliam os
restaurantes em função do serviço de vinhos. Pois eu lamento dizer-vos que
depois de dois anos e meio depois da inauguração ainda não fomos visitados por
nenhuma revista do mundo dos vinhos e menos ainda por especialistas da área da
gastronomia. Pior, já obtivemos dois prémios, um da Revista de Vinhos com uma
menção honrosa nas cartas de vinhos com melhor relação qualidade/preço e outro
no concurso de harmonizações com vinho do Porto, onde apesar da nossa
inexperiência neste tipo de concursos, conseguimos na nossa primeira
participação uma medalha de bronze. Ainda assim continuamos sem a visita de tão
ilustres senhores. Mais, obtivemos 4,8 pontos em 5 possíveis na avaliação feita
pelos senhores da ViniPortugal no serviço de vinhos a copo... Ainda assim, a
Wine, que tem exatamente uma rúbrica nesta matéria, prefere dar destaque a
restaurantes que recebem avaliações inferiores a 3. Pasme-se! São capazes de me
vir dizer que assim eles vão emendar-se e eu pergunto não seria uma melhor
política destacar os que têm melhores serviços de forma a que não apenas aquele
que é exposto, mas sim todos os outros se esforcem para tentar aparecer? É que
neste mundo da hotelaria, como em muitos outros, é por vezes melhor ser mal
falado que ignorado! Também já ouvi dizer, com alguma perplexidade, que não
visitam espaços antes de eles terem oito ou nove meses de idade, porque é a
idade média em que fecham portas. Claro, não admira, com a ajuda que recebem…
se há altura em que a ajuda é bem-vinda é no início, algo que aliás estes
senhores não têm problema nenhum em fazer antes dessa idade se o restaurante
for do Chefe Avilez ou do Chefe Sobral, mas como sempre, são sempre os mesmos a
serem ajudados.
Desculpem, mas tinha de fazer este desabafo, agora que estou
prestes a iniciar outro ciclo nesta minha recente vida como profissional de
hotelaria, que terá de ser fora de Portugal e da qual falarei posteriormente. Para
já apenas dizer que a nossa convidada foi substituída por outra que, para mim,
merece ainda mais, a minha mulher Alexandra Amorim (Ivone eu tinha de dizer
isto ou levava com o rolo da massa e com outros castigos bem mais penosos mas
que não posso explicitar…) que vai ter a provação maior nos próximos tempos e a
quem agradeço publicamente o apoio que me tem dado para ir em frente, apesar de
lhe doer. Beijoca, fofa.
Significa isto, que pelo menos as duas próximas Ivy Leagues,
serão comandadas e as crónicas escritas por outros. Luís Pedro Maia e Orlando
Costa são os senhores que estão na calha!
Mas vamos então à crónica propriamente dita e comecemos por
ver a lista de jogadores e respetivos selecionadores pela ordem de serviço:
Champagne André Clouet Silver Brut Nature - Jorge
Tavares
Anselmo Mendes Alvarinho "Curtimenta" 2005 -
Miguel Braga
Laroche Pouilly-Fuisse
Bourgogne Blanc 2000 - Alexandra Amorim
Domaine William Fevre Chablis
Grand Cru "Les Clos" 2005 - Alexandre Braga
Quinta dos Roques Encruzado 2008 - Luís Império
Trimbach Clos Ste Hune Alsace Riesling
2004 - Isabel Braga
Eitelsbacher Harthäuserhofberg
Mosel-Saar-Ruwer Spätlese Riesling 2005 - Orlando Costa
Château Jolys Terrae Escencia Jurançon 2001 -
Hildérico Coutinho
Como podem verificar foi mais uma enchente de vinhos
brancos, mas desta vez por causa do menu, que como poderão ver, se adequa muito
mais aos brancos:
MENU
Tempura de espargos
Risotto de sapateira
Almofada de frango em
pasta de caril com arroz basmati e tártaro de tomate
Iogurte de caramelo
com frutos vermelhos
O único falhanço nas
harmonizações aconteceu na sobremesa, que também foi o prato menos conseguido,
por não saber se o Château Jolys era doce ou seco e não querer provar antes do
jantar. Foi um erro porque ele tinha apenas alguma doçura, exatamente aquela
que era necessária para o prato de caril, o melhor da noite e com o qual teria
combinado na perfeição.
Aquele erro apenas veio
confirmar um pouco a tónica daquela que poderia ser a palavra que reflete, para
mim este jantar: deceção!
Eu não queria ser nada injusto
e o jantar até foi ótimo e os vinhos eram bons, mas a verdade é que eu esperava
sempre um pouco mais de todos os vinhos que foram servidos, excluindo talvez o
Qta dos Roques. Passo a explicar:
O vencedor da noite foi
provavelmente o Riesling mais caro que alguma vez bebemos nestas jornadas. Este
é o topo de gama da casa Trimbach, no que a Rieslings secos diz respeito.
Produzido com uvas provenientes de uma pequena parcela na localidade de
Hunawihr e sendo esta um dos produtores mais importantes da região, e tendo na
memória alguns dos belos vinhos que já bebemos desta região e inclusive deste
produtor era lícito esperar mais, pois não chega apresentar umas leves notas a
gás de isqueiro, típicas da casta, mais uma notas florais e algumas frutas
brancas a torna-lo mais agradável. Não, este vinho tinha de ter potência no
ataque de boca inicial e de ter profundidade para que nela permanecesse por um
bom bocado. A verdade é que era tudo bom, mas tudo demasiado soft e eu duvido
que a idade lhe dê o que estou aqui a pedir. Apenas 4 o classificaram em 1º
lugar, o Alexandre, o Miguel a Isabel e o Luís, sendo que o Jorge o colocou em
6º!
Em segundo lugar, a
apenas um ponto de distância e reforçando o que disse antes, veio o outro
Riesling, a mostrar o quão pouco gostamos dela… Este spätlese de um conceituado
produtor da minha região preferida da Alemanha, Mosel-Saar-Ruwer, mostrou-se
bem, mas mais uma vez, a minha memória lembra-se de coisas mais interessantes
neste registo, apesar de conceder que a doçura que apresentava ligava muito bem
com o picante do caril. Foi considerado como o melhor pela Alexandra, pelo
Jorge e pelo Orlando. A pior nota veio da Isabel com um 4º lugar.
Em 3º lugar ficou o Grand
Cru de Chablis, a região da Borgonha que menos me atrai pela extrema
mineralidade dos seus vinhos, mas que mal se via neste vinho. Aliás, estava de
tal modo escondida que este foi um dos vinhos que toda a gente errou pensando
tratar-se do Alvarinho! Quem diria? Esta semelhança foi de tal ordem que me
leva a perguntar, mas é este o estilo de vinho que é mais aclamado em Chablis?
Um vinho muito menos mineral e tão controlado em todos os aspetos que nem
parece um Chardonnay e muito menos um Chablis?
Bom, se assim for, a casta Alvarinho tem ainda mais potencial que aquele
que eu pensava…
Em 4º lugar ficou aquele
de que mais gostei, o Encruzado do Dão, elaborado por um dos melhores
produtores da região e, apesar de apenas ter 4 anos, a mostrar uma conjugação
extraordinária entre mineralidade, fruta e doçura, tendo sido porventura o que
mais profundidade apresentou.
Em 5º lugar aparece outro
Borgonha, mas desta vez de Pouilly-Fuisse e que creio não enganou ninguém
quanto ao facto de ser um Chardonnay da Borgonha, pois apresentava as notas
minerais e a madeira bem incorporada. Eu pensava que este é que seria o de
Chablis pois este já tem 12 anos e apresentou uma cor apenas ligeiramente
amarela.
O 6º lugar foi para o meu
vinho, que veio dos Pirinéus, mais propriamente de Jurançon e que é mais um
vinho fora do baralho, pois é elaborado com duas castas brancas, Gros e Petit Manseng, a primeira é de origem
basca e raramente é utilizada para a produção de vinhos doces e que aqui está
com apenas 20% do lote, sendo a segunda muito mais apropriada à elaboração de
colheitas tardias e cujo bago, como o nome indica, é mais pequeno. Os vinhos
secos de Jurançon, diz a bibliografia, são muito fortes e difíceis onde as
notas minerais da areia e do barro, que notámos no doce, serão aqui bem mais
complicadas de apreciar. A doçura torna este vinho difícil em algo apelativo
para os que gostam de coisas diferentes e não é por acaso que a casta Petit
Manseng esteja a seguir as pisadas da Viognier e a ser plantada por produtores
do novo mundo. Como curiosidade, será de referir que foi aqui que no século XIV
foi introduzida pela primeira vez o conceito de CRU, elogiando e protegendo
determinados locais como os melhores para a produção de vinho, mais tarde
copiado para outras regiões de França e não só com o sucesso que se conhece.
No 7º posto ficou o champanhe
com zero gramas de açúcar residual de que gosto por apresentar o que se espera
de um bom champanhe de gama de entrada, com notas evidentes de levedura e
alguns amanteigados. De realçar a evolução positiva que apresentou com o
aumento da temperatura, mostrando um nariz muito mais sedutor a citrinos e
flores brancas.
Em último lugar a maior
deceção, por ser um vinho que é elaborado à moda antiga, com fermentação
parcial com contacto pelicular e posterior estágio em barricas usadas sobre as
borras totais durante nove meses. Tudo isto deveria ter dado ao vinho a
possibilidade de viver e evoluir positivamente durante muitos anos. Pois bem a
evolução foi tão dramática que apresenta uma cor que me fez pensar tratar-se do
Borgonha de 2000 e não tenho grandes dúvidas em afirmar que se pegarmos em
Alvarinhos normais de 2005, eles estarão melhor que este Anselmo Mendes. Como é
óbvio, o problema não era a cor mas sim a muito pouca expressividade aromática
fazendo com que o vinho se mostrasse quase plano e estava praticamente morto.
Boa sorte para quem tiver ainda alguma destas garrafas, pois vai precisar…
Na questão dos acertos,
ganhou o Jorginho com 4 tiros certeiros em 6 possíveis mostrando, tal como a
Alexandra com 3, tantos quantos eu, que não é preciso vir muitas vezes aos
treinos para ter bons resultados. Mas quem nos tira o prazer de treinar? Deixem-se
disso!
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