Eis a crónica, sem mais comentários, que uma noite insólita me fez escrevinhar para o Jornal Beirão:
Deus apenas criou a água…
Faz pouco mais de uma semana, tive a oportunidade de estar num jantar com uma série de outros empresários da restauração, naquilo a que designaram por Irmandade do Avental. Bonito nome e iniciativa que poderia muito bem ser replicada pelos empresários aqui das nossas terras, pois permite um maior entrosamento e troca de experiências ajudando a afastar algumas invejas que sempre pontuam no povo português. Estes jantares vão rodando por alguns dos restauradores presentes na Irmandade e que tem ainda a vantagem de irem convidando produtores para apresentarem os seus vinhos, tendo desta vez calhado em sorte um bom e grande produtor do Alentejo, que não vou identificar e vão já perceber porquê.
Fui apresentado, mal entrei no restaurante, como sendo o autor dos cursos de vinhos que o restaurante vai proporcionando aos seus clientes ao dito produtor e reconhecido especialista em vinhos, que tratou logo de se posicionar ao dizer que já foi por diversas vezes júri em concursos internacionais de vinhos.
É muito comum estes convites a produtores por parte de quem organiza estes concursos, o problema tem mais a ver com aquilo que os convidados pensam saber sobre vinhos e, pior que qualquer outra coisa, das sábias tiradas destes senhores para um público incauto que as bebe sofregamente e de seguida repete até à exaustão com um remate final absolutamente irrebatível, de que foi dito por um “júri de concursos internacionais”.
O conhecimento sobre o vinho em Portugal é obtido e difundido essencialmente através da restauração e creio que facilmente podem perceber o terramoto que afirmações como as que vou proferir a seguir podem fazer quando ditas a profissionais desta área.
Fiquei pois a saber que os vinhos brancos deveriam ser servidos a 4ºC, pois segundo ele, o vinho aquece imediatamente (verdade) e atinge rapidamente os 8ºC – 9ºC (não tão verdade); deixando por esclarecer o que fazer com aqueles brancos que se devem beber a 12ºC. Talvez esperar que a refeição acabe …
Fiquei também a saber que os espumantes depois do dégorgement não aguentam mais de dois ou três anos e espero que nenhum produtor de Champagne nos esteja a ler … (pretensão a minha né?)
Que com a sobremesa se devem servir vinhos secos para não serem enjoativos … Experimentem e vejam um vinho agradável ficar com azedume...
At last but not the least, veio-me este senhor informar que os vinhos verdes são feitos com uvas mal maturadas, justificando assim a existência do vinho maduro (!!!) e que era por isso que nessa altura se vendia muito mosto concentrado … Não estará com as latitudes trocadas?
E mais não ouvi porque resolvi vir embora que a almofada era bem melhor conselheira.
Boas provas e não acreditem em tudo o que ouvem ou lêem, incluindo o autor destas linhas, até porque em ultima análise eu nunca sei o que vocês estão a saborear…
Hildérico Coutinho
Detentor do 2º e 3º Nível do WSET (Wine and Spirits Education Trust)
www.galeriadevinhos.com
Quo Vadis? Enoteca e Cozinha Mediterrânica (Matosinhos)
http://qvquovadis.blogspot.com/
quinta-feira, 10 de março de 2011
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